A SOLUÇÃO
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Frederico “Cedê” Silva
Disse um famoso cronista que a juventude brasileira- ao contrário do que se pensa- nunca perdeu o hábito da leitura. E sabe por quê? Porque nunca o teve.
Piadas à parte, é fato que o jovem brasileiro lê pouco. Aliás, quase nada. Mas quase nada mesmo- ou até menos. De fato, esse grave analfabetismo funcional já foi alvo de inúmeras críticas e dissertações. Não foram poucos a arriscar palpites sobre razões para esse desinteresse pela leitura e possíveis soluções para o problema. Nada que tenha dado certo, claro. De certa maneira, acho desconcertante que nunca ninguém da intelectualidade brasileira tenha anunciado a solução definitiva, que é óbvia. Then again, apenas um jovem poderia achar a fórmula para fazer com que a juventude passe a ler.
Bem, eu sou jovem- ou pelo menos era até a última vez que chequei minha Carteira de Identidade- e eu tenho a solução. Eu sei como resolver o problema. E vou contar agora- sem mais suspense- como fazer com que os jovens brasileiros se embrenhem nos caminhos da leitura:
Basta proibir.
Sim, sociedade brasileira, é isso mesmo. Asseguro-lhes com toda a convicção de que em pouquíssimo tempo- muito menos do que qualquer um possa imaginar- a proibição da leitura se desdobraria numa série de eventos das mais inesperadas proporções.
Adolescentes passariam a cochichar nos cantos mais recônditos dos colégios questões literárias.
- Mas e aí, cara, você acha que a Capitu traiu ou não traiu?
- Olha, eu acho que não traiu.
- Você não sabe de nada.
- ...
- Esse papo de não trair, não sei não... acho que você é do DOI-CODI.
- Que isso, véi. Não vacila não.
- Tem um fessor vindo aí! Esconde o bagulho!
E esconderia o
Dom Casmurro numa embalagem de
Sucrilhos.
Muito mais que isso aconteceria. Proibir a leitura significa proibir estudar. Já posso ver as manchetes:
“ Notas nos vestibulares sofrem escalada assustadora”
A única leitura permitida aos jovens devia ser Capricho, Quatro Rodas e Paulo Coelho.
“ Editoras Abril e Rocco fazem demissão em massa”
Não existem jovens que copiam os estilos de roupa de seus personagens favoritos nas telenovelas? Pois então.
- Você viu só? Os brechós estão cheios de encomendas.
- Nova moda?
- É. As mais recatadas estão de Ceci. Mas nos bailes funk e na praia, só se usa Iracema.
- Eles não tem medo de serem descobertos como leitores?
- Nada. Roupa não é prova.
O seguinte diálogo nas boates...
- Ora (direis!) ouvir estrelas!
- Ih, sai fora, metido a besta. Tá delirando?
...seria trocado por este:
- Ora (direis!) ouvir estrelas!
- Pô, só sabem esse? Sai fora.
Por força da lei, as universidades não poderiam mais cobrar questões sobre livros em seus exames de admissão. Teriam de usar capítulos de Malhação no lugar.
“Sobre a estética hedonista da personagem Cabeção, pode-se afirmar que, EXCETO...”
As questões teriam baixíssimos níveis de acerto. Apenas uns poucos nerds assistiriam aos capítulos. Os demais alunos pegariam resumos ou então nem ligariam, ocupando seu tempo lendo volumes do Quintana ou do Amado.
A coisa atingiria proporções descomunais. Em poucos anos, a juventude brasileira seria considerada a mais culta do planeta. O Brasil logo seria hours concours em todas as categorias do Prêmio Nobel. Ocuparíamos os cargos mais importantes da ONU. Políticos brasileiros candidatariam-se a prefeitos em todos os países do mundo. Toda a imprensa do globo criticaria o agressivo imperialismo cultural brasileiro. Tupiniquins, go home!
Temos que proibir a leitura, o quanto antes. Pelo bem do País. Ah, imaginem só as cenas! Um jovem se aproxima da entrada do morro.
- E aí, sangue.
- Tá com o bagulho?
- Trouxe a grana?
- Tá aqui.
- Tá aqui.
- Doido... uma mochila com Bilac, Rosa e Andrade.
- Coisa fina.
- Aqui...
- Quê?
- Aproveita e me vê uns quatro beques que eu não güento isso na limpeza não.
Peixes: